Violência doméstica dispara na quarentena: como reconhecer, proteger e denunciar

19/05/2020
Segundo dados do TJRJ, houve aumento de mais de 50% no número de denúncias desde que o isolamento começou
Carolina Mazzi

Violência contra a mulher Foto: Editoria de Arte

RIO – Desde que as medidas de isolamento social, para quem pode ficar em casa, entraram em vigor, um triste número também começou a subir nas estatísticas, e não de casos da Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus. Foram o de denúncias de violência doméstica: o aumento foi de cerca de 50% apenas no Rio de Janeiro, mas a realidade de avanço nos casos aconteceu em todo o mundo.

Segundo especialistas, a convivência intensa, a tensão do momento e o próprio isolamento social, longe de parentes e amigos, contribui para que o número de casos de violência doméstica aumentem ou piorem. Mas os casos notificados ainda estão bem abaixo da realidade, afirma Marisa Gaudio, diretora de Mulheres da OAB-RJ:

– A maioria das mulheres não denuncia o seu agressor ainda. Vivemos em uma sociedade muito machista e patriarcal que culpabiliza a mulher pela agressão, pelo fim de uma relação, especialmente se envolver filhos, e que desestimula essa mulher a denunciar. O convívio intenso, nesse momento de muita ansiedade e tensão, tem piorado os casos. Uma pessoa que nunca bateu, por exemplo, pode ter descambado para a violência física.

A advogada lembra que não é apenas a agressão física que característica a violência doméstica, mas também a moral, psicológica, patrimonial e sexual. E que informação é fundamental nesse momento:

– Muitas mulheres têm dificuldade inclusive de reconhecer que estão em uma relação de violência. Por isso é tão importante a informação e saber que há uma rede de serviços para essas mulheres. Amigos e familiares também precisam estar atentos. Uma agressão psicológica pode levar a uma física que pode levar ao feminicídio.

A Escola de Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) também lançou uma cartilha explicativa sobre a violência doméstica, com informações e formas de procurar ajuda, elaborada pela juíza Adriana Ramos de Mello, titular do I Juizado de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher do Rio de Janeiro.

Aumento de casos. Com as medidas de isolamento social para quem pode ficar em casa, governos em todo o mundo relatam aumento nas denúncias de violência doméstica. Segundo a ONU Mulheres, é uma das preocupações durante a quarentena, já que não somente as mulheres estão afastadas de suas redes de apoio (familiares e amigos), mas estão tendo que conviver o tempo todo com o possível agressor.

No Brasil. Aqui, não é diferente. Segundo o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), houve aumento de mais de 50% no número de denúncias de violência doméstica desde que a quarentena começou, em março.

Dificuldades. Segundo especialistas, por estarem envolvidas emocionalmente, muitas vezes com filhos, as mulheres têm dificuldade de identificar principalmente as agressões psicológicas, que podem levar as agressões físicas e até ao feminicídio. A sociedade tende a estigmatizar e culpabilizar a mulher em casos como esses e desestimular que denunciem os agressores.

Sinais. Comportamento controlador por parte do parceiro, grosseria, frustração com expectativas irreais em relação à parceira, crueldade (não apenas em relação à mulher, mas também a outras pessoas e até crianças) e hipersensibilidade (em que tudo ofende o parceiro) são sinais de alerta.

Tipos. A agressão física, normalmente, é o último estágio de um relacionamento que já era abusivo de outras formas. Agressões psicológica, moral, sexual e patrimonial também configuram violência doméstica.

Como identificar. Segundo especialistas, informação sobre violência doméstica (o que é e como se manifesta) ajuda mulheres a se identificarem dentro de uma relação abusiva. No relacionamento, comportamentos e atitudes em que a mulher se sinta ofendida são sinais de alerta. Frases que depreciam a pessoa e baixam a autoestima, como “ninguém vai te querer”, ou xingamentos também caracterizam violência psicológica e moral.

Solidão. Outra forma de violência doméstica é a que afasta as mulheres de seu convívio social, muitas vezes com o pretexto de ciúme ou proteção, tirando-a de perto de seus familiares e amigos. A dependência financeira, até mesmo impedindo que a mulher trabalhe ou controlando seus rendimentos, também é uma forma de domínio que o homem pode exercer em casos de abuso doméstico.

Sem desculpa. Qualquer tipo de agressão física, mesmo empurrões, é violência doméstica.

Durante a pandemia. Impedir a higienização das mãos, disseminar informações equivocadas sobre a pandemia e não permitir comunicação com amigos e familiares também são considerados violência, afirma a OMS.

Ciclos. Em geral, há um ciclo de violência dentro da relação, que começa, segundo especialistas, com a fase da tensão, em que há troca de insultos, xingamentos e muitos conflitos. Após isso, costuma acontecer a fase da agressão, inclusive física. Depois, há a fase da reaproximação, com reconciliação e promessa de melhora, antes de o ciclo reiniciar, cada vez com mais frequência.

Proteção. Há um protocolo para as mulheres identificarem que estão em uma relação violenta. Antes mesmo das agressões, avise familiares e amigos de sua situação. Deixe anotado o número de serviços de apoio à mulher. Deixe itens essenciais (como chave, documentos e dinheiro) juntos, em um local específico. Planeje a saída para algum lugar seguro. Busque ajuda nos serviços de proteção à mulher, delegacias ou outros locais próximos que podem oferecer acolhimento, seja uma igreja ou mesmo um comércio. Se estiver ferida, busque um hospital e relate o que aconteceu.

Denuncie. Os números em relação à violência doméstica, em todo o mundo, são subnotificados, já que a maioria ainda não denuncia seus agressores. No Rio, é possível fazer a denúncia virtualmente. O telefone para denunciar é o 180. A Delegacia da Mulher (DEAM) e os Juizados de Violência Doméstica e Familiar cuidam especificamente desses casos. Outros números para apoio nessa situação: (21) 23328249 (Disque Mulher), 127 (Ministério Público) e (21) 972268267 (Núcleo Especial de Direito da Mulher e Vítimas de Violência da Defensoria do Rio).

Ajuda. A velha história de que “em briga de homem e mulher ninguém mete a colher” deve ser deixada de lado. Amigos e familiares podem intervir e denunciar os casos. Se você conhece alguém passando por esta situação, ofereça ajuda, busque contato, procure saber.

Não é culpa sua. A culpabilização e a vergonha ainda são grandes impedimentos para que mulheres denunciem seus parceiros. Nenhum ato de violência é justificável.

Fonte: https://oglobo.globo.com/

 

 

 

 

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